A impossibilidade de cobrança do IPI…

A impossibilidade de cobrança do IPI nas importações de bem para uso ou consumo promovidas por pessoa física.

Importar: mandar vir ou trazer de país estranho[1]. A aludida definição elenca condutas praticadas em proporções colossais no mundo atual.

Fomentadas pela globalização, fenômeno cuja evolução se justifica em grande parte pela modernização das tecnologias empregadas nos meios de transporte e comunicação, as operações de importação se constituem em atividades realizadas diariamente por pessoas físicas e jurídicas, com vistas ao alcance de finalidades comerciais ou ao deleite daquele que se aproveitará do uso e consumo do bem.

Ante o volume maciço da entrada de bens estrangeiros no território nacional, afirma-se que os tributos incidentes sobre as importações constituem vultosa fonte de arrecadação de receitas por parte dos entes públicos, especialmente, da União e dos Estados, haja vista serem estes os credores das obrigações fiscais que têm por objeto o ato de importar.

Dentre as exações passíveis de exigência na aquisição de bens importados, podem-se citar, a título ilustrativo, o imposto de importação (II), o imposto sobre produtos industrializados (IPI), a contribuição para o Programa de Integração Social (PIS), a contribuição para financiamento da seguridade social (COFINS) e o imposto sobre a circulação de mercadorias e serviços (ICMS).

Em face disso, infere-se que o custo da importação de um bem é elevado por força dos inúmeros gravames tributários incidentes sobre a operação.

Ressalta-se, entretanto, que o simples ingresso de bem no país não implica, necessariamente, a obrigação de recolher todos os tributos que têm a importação como seu fato gerador.

A fim de comprovar tal afirmação, concedendo-lhe contornos concretos, o presente estudo se incumbe de demonstrar a impossibilidade jurídica de exigência do IPI em face de pessoa física adquirente de bem estrangeiro para uso ou consumo próprio.

Em regra, o imposto em comento é devido nas aquisições de bens industrializados. Como a importação se enquadra nesta modalidade de operação, verifica-se a legitimidade da exigência do IPI quando concretizada a compra de produtos e equipamentos estrangeiros.

No entanto, não estão sujeitas ao recolhimento do imposto as pessoas físicas importadoras de bens destinados ao seu próprio uso ou consumo.

A Constituição Federal, em seu artigo 155, § 3º, inciso III, preceitua que a sistemática de recolhimento do tributo deve seguir o princípio da não-cumulatividade, pela qual os valores pagos a título de imposto na aquisição de bem devem ser utilizados como créditos para fins de abatimento da exação oriunda da sua alienação.

O IPI ser não-cumulativo significa que a incidência do tributo pressupõe a realização de uma operação de compra do bem visando à sua industrialização e posterior venda.

Todavia, na hipótese em estudo, inexiste a possibilidade de se prestigiar a não-cumulatividade, uma vez que a importação é promovida para o uso ou consumo do próprio importador, de maneira que, adquirido o bem, o mesmo não será objeto de industrialização para fins de posterior alienação.

Assim, não concebida a cadeia produtiva de compra e venda de bem industrializado necessária à aplicação do princípio da não-cumulatividade, incontestável a impossibilidade jurídica de incidência do IPI.

Ante o fato de a pessoa física importadora não poder compensar os créditos do aludido gravame com débito do mesmo imposto oriundo da alienação do bem importado, o que se dá em decorrência da inexistência desta operação, conclui-se que o axioma mencionado no parágrafo anterior não surtirá os efeitos esperados pela Constituição Federal, não sendo, por isso, exigível o IPI.

Este entendimento, inclusive, é ratificado pelo Supremo Tribunal Federal, consoante se observa do acórdão proferido no RE 255682/RS, em que atuou como Relator o Ministro Carlos Velloso.

Com base nas considerações tecidas acima, conclui-se que à União resta vedada a cobrança do IPI nas importações promovidas por pessoa física para fins de aquisição de bens de uso ou consumo próprio.

Frisa-se que, como tal vedação é fruto de interpretação de dispositivo de índole constitucional, inexiste norma específica destinada a afastar a exigência em estudo em favor das pessoas físicas importadoras, razão pela qual a Receita Federal continua a realizar a cobrança do tributo.

A despeito disso, qualifica-se a conduta do órgão fazendário como manifestamente ilegítima, de modo que, cientificada da lavratura de autuação ou do ajuizamento de execução destinada a satisfazer débito de IPI supostamente decorrente de importação para uso ou consumo próprio, deve a pessoa física se opor à injusta ação fiscal, tendo em vista a sua improcedência à luz das normas vigentes.

Thiago Bouchabki Puppin, advogado da área tributária do Escritório Brum & Advogados Associados em Vitória/ES e pós-graduando em Direito Tributário.