Questões de direito do trabalho na compra e venda de empresas.

Questões de direito do trabalho na compra e venda de empresas

Na venda e aquisição de sociedades empresárias, é comum se dizer que quem adquire uma empresa adquire não só os seus bônus, mas também os seus ônus. E tal afirmativa bem retrata a realidade, visto que ela decorre de dispositivos legais que regulam o Direito Empresarial. E é por causa dessa assertiva que, quando há interesse em comprar ou vender empresas, são realizadas análises minuciosas de suas contas – nada mais natural. É preciso dar ao sócio adquirente, plena ciência da real situação da empresa e das chances de rentabilidade e lucro, bem como dos riscos, oriundos de eventual aquisição.

Assim, uma vez consciente da situação da empresa, o sócio que adentra uma sociedade empresária, comprando-lhe total ou parcialmente, responde pelos débitos da empresa anteriores ao seu ingresso na sociedade. O sócio que se retira da sociedade empresária, por sua vez, permanece responsável pelas obrigações que possuía na qualidade de integrante da sociedade pelo período de 02 (dois) anos após a alteração do quadro societário junto à respectiva Junta Comercial.

Desse modo, na visão do Direito Empresarial e dos dispositivos que regulam esse tipo de transação, ultrapassado o prazo de 02 (dois) anos em questão, o sócio que alienou suas quotas não teria mais nenhuma responsabilidade pelos débitos da empresa, ainda que digam respeito à época em que ele a integrava.

No entanto, o Direito do Trabalho tem uma visão diferenciada acerca dessa matéria, cuja peculiaridade exige uma breve análise.

Nesse ramo do direito, os sócios atuais de uma empresa respondem pelos débitos trabalhistas anteriores ao seu ingresso na sociedade (até aí, sem alterações: os novos sócios assumem o ativo e o passivo da sociedade empresária). Porém, também se considera responsável nesse aspecto aqueles que tenham sido sócios da empresa na época da prestação de serviço do empregado que venha a ter reconhecidos direitos perante a Justiça do Trabalho. Isso porque se pressupõe que eventuais violações aos direitos trabalhistas do funcionário teriam ocorrido na gestão ou sob a interferência do ex-sócio.

Dessa forma, é possível que um sócio que já tenha se retirado de uma empresa há mais de dois anos seja surpreendido por uma execução trabalhista, podendo ter seu patrimônio alcançado para adimpli-la – o que já foi observado em alguns casos até mesmo antes de se tentar encontrar patrimônio da própria empresa ou dos sócios atuais, violando-se, assim, o chamado benefício de ordem.

Nesse contexto, de qualquer modo, merece destaque que a desconsideração da personalidade jurídica, instituto que autoriza a utilização do patrimônio do sócio ou, no caso, do ex-sócio, para adimplir débitos da sociedade empresária, no âmbito da Justiça do Trabalho, é um instituto utiizado com mais frequência e com rigor um pouco menos excessivo que nas demais áreas do direito,

Por essa razão, é necessário que se conheça tal entendimento da Justiça do Trabalho quando da alienação de quotas empresariais. E, caso se queira resguardar o ex-sócio, por entender que não é razoável que, após anos de sua retirada da sociedade, quando não mais usufrui dos frutos que a empresa proporciona, seja constrangido em seu patrimônio, sobretudo quando o sócio adquirente/ingressante conhecia, à época da aquisição de suas cotas, o passivo da empresa, faz-se prudente adotar algumas medidas.

Com esse propósito, pode-se prever, no contrato de compra e venda que, depois de ultrapassado o prazo de dois anos já mencionado, o qual é previsto em lei: caberá eventual indenização ao sócio retirante caso seu patrimônio pessoal venha a ser atingido; inclusão de cláusula que preveja expressamente a não responsabilidade do ex-sócio no que tange a verbas trabalhistas e a sua impossibilidade de responder por elas em nome da empresa; ou mesmo o direito do ex-sócio de ajuizar ação de regresso em face dos sócios atuais e da própria empresa para ser indenizado no que tiver sido constrangido em seus bens.

Assim, com essas ações, buscam-se medidas aptas a produzirem os efeitos pretendidos, urgindo-se destacar, no entanto, que se tratam de instrumentos para tentar resguardar o patrimônio do ex-sócio e a tranquilidade de ambas as partes no que se refere ao negócio celebrado, sendo que a eficácia somente se verificará de acordo com as nuances de cada caso concreto.

Por fim, impende frisar que, ainda que não se possa assegurar a efetividade das medidas em comento, essas vão ao encontro do princípio da segurança jurídica, combatendo-se a responsabilização ad eternum, que vem se propagando no âmbito da Justiça do Trabalho.

 

Guadalupe Souza Sampaio, bacharel em Direito pela Faculdade Brasileira de Vitória – UNIVIX, ex-advogada da área trabalhista do escritório de advocacia Brum & Advogados Associados; Camilo Costa de Queiroz, estudante de Direito da Universidade Federal do Espírito Santo e estagiário da área trabalhista do escritório de advocacia Brum & Advogados Associados.


1 Comentários para esta entrada

Enrique BECIN
março 15th, 2016 on 14:18

Bom dia;
Obrigado pela informação, claro e objetivo.
Enrique